Dezesseis anos depois da construção da Usina Hidrelétrica de Manso, localizada no município de Chapada dos Guimarães, a 65 km de Cuiabá, cerca de 400 pessoas atingidas com a barragem ainda tentam receber indenização por desapropriação. Segundo o Movimento dos Atingidos por Furnas (MAF), os pagamentos feitos às mais de 700 famílias, em 2012, pela concessionária de energia Furnas, administradora do empreendimento, não contemplaram todos os moradores prejudicados.
Em nota, Furnas informou que já cumpriu e quitou todos os acordos de reparação envolvendo 880 famílias reconhecidas por auditoria social externa como atingidas pela implantação do Aproveitamento Hidrelétrico de Manso (APM Manso), em 2000.
Segundo a concessionária, através de um acordo firmado com o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), em 2012, foram pagos R$ 72 milhões às famílias, que, durante o período de negociação, também teriam recebido ajuda de custo no valor de R$ 23 milhões.
“Em diversos casos, pessoas excluídas do levantamento para receber a indenização tinham o mesmo perfil de pessoas que tiveram direito a receber”, afirmou Maria Cândida.
A vice-diretora do Movimento dos Atingidos por Funas (MAF), Maria Cândida da Silva, afirma que a lista com o nome das pessoas que deveriam receber as indenizações não incluiu todos os atingidos com a construção da barragem. Ela relata que os critérios de seleção do movimento que intermediava as negociações dos moradores com Furnas não eram transparentes.
Ela relata que, na época da desocupação, várias pessoas que não moravam na região montaram barracos às margens do rio, com o intuito de receber indenização. Segundo ela, o Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB) teria incluído irregularmente essas famílias na lista dos que deveriam receber indenização e muitos deles receberam o benefício indevidamente.
O G1 tentou ouvir o MAB Manso, mas não localizou a sede da empresa e nem conseguiu entrar em contato por telefone.
De acordo com Jeferson Nascimento, da diretoria do MAB da Bacia do Teles Pires, o movimento em Manso utilizava do nome da entidade, mas deixou de ser reconhecido pela corrente nacional. “A construção do MAB Manso é um dos maiores desastres nacionais. Foram graves problemas com as lideranças, que divergiam da ideologia da corrente nacional”, relatou.
Maria Cândida conta que a propriedade onde nasceu e viveu até os 21 anos está completamente submersa. Agora, com 35 anos, ela mora na área urbana de Chapada dos Guimarães, a 65 km de Cuiabá, e trabalha como diarista. Vice-presidente do MAF, também está entre os moradores que ainda não foram indenizados.
“Eu e minha irmã fomos excluídas de receber a indenização. Até hoje não nos explicaram com clareza os motivos disso. Também não recebemos a ajuda de custo ou qualquer quantia para auxiliar no deslocamento. A direção do MAB, na época, disse que, como eram mulheres e não chefiavam as respectivas famílias, não tinham direito a receber indenização. Mas não faz sentido, por que eu já era viúva e mãe dos meus dois filhos”, conta Maria Cândida.
Da família dela, o irmão mais velho recebeu uma casa na época da desocupação, em 2000. Mas a mãe dela, viúva à época e hoje com 65 anos, teve de esperar até 2012 para receber cerca de R$ 160 mil. No mesmo ano, Maria Cândida conta que o irmão mais novo foi indenizado em uma quantia de aproximadamente R$ 50 mil.
“Se essa situação tivesse acontecido hoje eu teria contestado e exigido a minha parte. Mas minha família e a maioria dos afetados moravam em sítios e não tinham conhecimento de direitos e leis”, avaliou.
O processo de indenização das 880 famílias prejudicadas com a construção de Manso teve início em 2006, quando o MAB assinou o Termo de Acordo Global (TAG) com a empresa Furnas. Cada beneficiário deveria receber uma casa com energia elétrica e água encanada. A propriedade deveria ter ao menos quatro hectares de terras mecanizadas, com maquinário, consultoria agrícola durante cinco anos, além de escola, posto de saúde, templo religioso e quadra de esportes nas proximidades.
De acordo com o MAF, uma parte dos desalojados foi transferida para localidades em que as terras não eram produtivas, como as que moravam antes. Segundo o movimento, quem não recebeu a casa, foi obrigado a se estabelecer na cidade e, de certa forma, entrou para o percentual da população com dificuldades de acesso à escola, saúde e emprego.
O caso dos atingidos pela barragem da Usina Hidrelétrica de Manso foi investigado pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 2004. Pesquisadores percorreram toda a região de Manso e produziram um relatório sobre a violação de direitos humanos, econômicos, sociais e culturais. No documento, a ONU acusou Furnas Centrais Elétricas de empobrecer as famílias da região. Disse ainda que a retirada dos moradores da região do Rio Manso causou um "genocídio cultural, pois vitimou grupos tradicionais e populações rurais".
Outros atingidos
A Federação das Colônias de Pescadores do Estado de Mato Grosso pede na Justiça que a administração da Hidrelétrica de Manso seja condenada a pagar danos materiais e morais sofridos por cerca de 2,2 mil pescadores. De acordo com o presidente da Colónia Z1, Belmiro Lopes, o funcionamento da usina é diretamente responsável pela diminuição da quantidade de peixes nos rios da bacia.
A Federação das Colônias de Pescadores do Estado de Mato Grosso pede na Justiça que a administração da Hidrelétrica de Manso seja condenada a pagar danos materiais e morais sofridos por cerca de 2,2 mil pescadores. De acordo com o presidente da Colónia Z1, Belmiro Lopes, o funcionamento da usina é diretamente responsável pela diminuição da quantidade de peixes nos rios da bacia.
Segundo Furnas, embasada nas conclusões de estudos técnicos de biologia, ecologia e sociologia, realizados no período de 2000 a 2008, a concessionária de energia contestou na Justiça o prejuízo alegado pelos pescadores.
Em 2003, as colônias de pescadores de Cuiabá, Barão de Melgaço, Nobres, Santo Antônio de Leverger, Rosário Oeste e Várzea Grande, entraram com uma ação contra Furnas, pedindo indenizações pelas perdas econômicas dos profissionais da pesca. Os pescadores ganharam na primeira instância, mas perderam em segunda instância. O processo ainda tramita no Judicário.
De acordo com a Federação Estadual dos Pescadores, as barragens são construídas nas cabeceiras dos rios, em corredeiras e pontos de cachoeiras, como é o caso de Manso. Estes locais são os preferidos dos peixes quando precisam se reproduzir. Os pescadores relatam que uma das espécies que não são mais encontradas com facilidade nos rios atingidos, como é o caso do Pacu.
“Quando a barragem solta a água, a cada três dias, a água vem suja, cheia de vegetação, podre. Como é que o peixe consegue se reproduzir nessas condições? Como é que o pescador tira o sustento da família? Ninguém pensa nisso”, explicou Belmiro.
Licença ambiental
A licença de operação da Usina de Manso venceu há cinco anos, segundo a Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema). Desde então, o empreendimento vem funcionando sem nenhuma licença em vigor. A última Licença de Operação (LO) foi concedida à usina de Manso em 2006, após Furnas mover e ganhar na Justiça a liberação do documento pela Sema.
A licença de operação da Usina de Manso venceu há cinco anos, segundo a Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema). Desde então, o empreendimento vem funcionando sem nenhuma licença em vigor. A última Licença de Operação (LO) foi concedida à usina de Manso em 2006, após Furnas mover e ganhar na Justiça a liberação do documento pela Sema.
Ao G1, Furnas informou que o Aproveitamento Múltiplo de Manso (APM) possui a licença vigente, emitida em 2006, cuja renovação foi solicitada à Sema em 2007. De acordo com a concessionária, desde então, diversas atividades foram realizadas em conjunto com a Sema, visando o cumprimento do TAG.
Ainda em 2000, foi assinado entre Furnas e a Sema um Termo de Ajuste aos Programas Ambientais (TAG) que previa, pelo menos, 22 ações de compensação ambiental. Entre as ações estavam listadas, por exemplo, o monitoramento das condições de erosão e qualidade da água, monitoramento da utilização dos recursos florestais, manejo e conservação da fauna, compensação por perdas ambientais, implantação do sistema geográfico de informações, gestão ambiental, de conservação da flora.
Na última vistoria realizada pela Sema, em novembro de 2015, foi constatado que apenas três Programas Ambientais, dos 22 previstos, estão sendo executados, atualmente. No relatório, Furnas alegou que deve lançar um edital para estudo de erosão através de imagem, mas nada foi registrado sobre compensação ambiental, social e financeira dos atingidos pela barragem.
APM Manso
O projeto do Aproveitamento Múltiplo de Manso (APM Manso) começou a ser planejado em 1974, após uma enchente que deixou 24 mil moradores desabrigados na Baixada Cuiabana. A barragem tinha como principal objetivo regular o nível da água do Rio Cuiabá. A usina está localizada no Rio Manso, principal afluente do Rio Cuiabá.
O projeto do Aproveitamento Múltiplo de Manso (APM Manso) começou a ser planejado em 1974, após uma enchente que deixou 24 mil moradores desabrigados na Baixada Cuiabana. A barragem tinha como principal objetivo regular o nível da água do Rio Cuiabá. A usina está localizada no Rio Manso, principal afluente do Rio Cuiabá.
A construção da Usina Hidrelétrica de Manso foi feita pelo governo estadual em parceria Furnas, responsável por 70% do empreendimento. O reservatório atinge uma área de 427 quilômetros quadrados nos municípios de Chapada dos Guimarães e Nova Brasilândia, a 65km e 223 km de Cuiabá, respectivamente.
Fonte: G1 MT
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